KindS of Blue...: março 2008

segunda-feira, 24 de março de 2008

Prólogo: "o abraço do mundo"

A menina chorou olhando para o céu.
Viu seu destino aportar no vale dos sonhos distantes.

Sua janela já não era grande o suficiente para carregar o peso de seus quinze anos de existência e as fases que essa idade traz. Também não era robusta para aguentar tão cedo - embora o amadurecimento da idade adulta se aproximasse - as faces de um mundo real e cruel, que abraçava-lhe a soberania de sonhar.

Mas este epílogo ainda é página distante...

domingo, 23 de março de 2008

Reencontros

"Do Cvidanja" é uma expressão em russo que significa "verei você novamente".
É algo mais como uma promessa, mas longe de ser exatamente um "adeus".


Friedrich W. Nietszche também cita algo semelhante em sua (inacabada) teoria do Eterno Retorno (em alemão, Ewige Wiederkunft). Nesta, ele propõe que nossa existência não é uma jornada de ciclos que se repetem e que o mundo não se faz de pólos opostos, mas de faces complementares que se montam em uma única realidade.

Bem e mal, amor e ódio, fogo e água, feio e belo, harmonia e dissonância... todos são compostos de um mesmo líquido, uma mesma amálgama de Vida.

O momento de nossos reencontros (sejam com alguém ou alguma coisa) é a hora da consagração das memórias; da exaltação de uma construção hierárquica de etapas do Eu. É nele que nos deparamos com medos, aflições, ansiedades passadas que voltam à tona como um soco no estômago.



Mas é do estômago também que vem aquele friozinho chamado expectativa... E da expectativa nasce o desejo por respostas de significados que ainda não temos; ou de reminiscência, de situações e sensações distantes já vividas, mas pelas quais daríamos tudo para reaviva-las de forma tão sólida quanto nossos próprios ossos.

Passaríamos por um processo de lancinantes dores para enxergar ou reviver a estrutura dos ossos da saudade, da melancolia, do júbilo pelo passado? Renunciaríamos à nossa condição de perfeita saúde só por uns momentos de reencontro com nossa gênese, nosso cerne, nossa infância mesmo que para isso tenhamos que passar pelo incômodo da extrema dor?


De onde vem, então, aquela sensação de que adoraríamos o mais belo templo das memórias, da felicidade, da eternidade? Um local onde se possa sentir as respostas de tudo que sempre permeou nossos desejos, angústias, saudades, amores, vontades, conquistas... um lugar onde o máximo momento, a apotheosis da condição humana e suas perfeitas imperfeições se revelariam tão palpáveis quanto o chão que pisamos.

Onde a mais bela das Músicas tocaria solenemente, seja como uma contemplação das mais infindáveis e belas emoções humanas ou como um réquiem anunciando a estrada final da vida terrena... e abrindo o caminho para o limiar entre o tempo e o espaço, o além-vida... e que fosse um lugar onde essa Música se traduzisse em formas, imagens, frases e significados que não nos deixassem sem nenhuma sombra de dúvida de seus propósitos, dizendo:

“Isto é para você, por você e com você, por causa de...”

Somente a canção, as notas, os instrumentos mais serenos e fortes, sem nenhuma intervenção interpretativa, mas com seus ritmos pulsando em compasso com a alma.

Acreditando ou não que haja algo além desta vida, todos já sentimos aquele torpor na parte posterior da cabeça, de uma forma em que nosso cérebro se encontra em plena letargia, mas de alguma forma, simultaneamente, conectado a tudo o que não é meramente material. A todas as pessoas importantes e que estão distantes... a todas as lembranças e desejos bons... a todas as sensações que conseguimos lembrar e que ficaram guardadas intocáveis como relíquias sagradas nas câmaras destes mausoléus de memórias sólidas...

Memórias, estas, tão fugazes como a fumaça do incenso mais aromático: altamente prazerosa, porém, que foge e se desmancha ao tentar ser tocada por mãos curiosas. Tão fugazes e frágeis como uma perfeita bolha de sabão...

Onde nos encontraremos?

Como nos encontraremos?

Quando nos encontraremos?

“Vejo você mais tarde...”, alguém me diz.

Mas o tal “mais tarde” não possui qualquer corrente, lógica, princípio que lhe prenda à noção do fluxo exato do tempo. Mas disse o filósofo Amiel que “o tempo é o espaço entre duas recordações”.

Nesta hora, me calo.




E na minha pequena ignorância (e esperança) me indago:

Somos fadados, então, a nos reencontrar sempre, nesta ou em outra vida?

"Verei você novamente..."