KindS of Blue...: agosto 2008

terça-feira, 19 de agosto de 2008

Muda de pele

Eu tô trocando tudo, fazendo a faxina,
limpeza geral na armadura do corpo e na usina da mente.
Nessa muda de pele, eu jogo fora as células velhas
com um esfregão de braço a braço;

Eu jogo fora as velhas cartas,
as antigas funções, os manjados
bordões, os caducos jargões;
os conceitos pueris dentro de cadernos empoeirados
da adolescência que hoje já têm suas respostas
preenchidas na atualidade do meu coração.


Eu hoje quero mudar, expurgar tudo!
O que for atraso, escárnio,
estagnação do caminho com pedras
vai ser removido
com um batalhão de escavadeiras
pintadas com um grande "M".

Eu agora faço minhas preces com um incenso
e energizo os cantos deste quarto:
meus bons livros, cd's e uma plantinha -
vejam só! ela já dá novas flores...

Mas também quero renovar a sede eterna:
completar as novas perguntas,
as questões de uma nova era.
Jamais confundindo movimento com ação -
mas sabendo que este é o princípio de toda compreensão!


Agora e sempre,
este é meu lema a todo momento:

"Cinzas ao mar,
velas ao vento!"


segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Mostra

Daquela janela, eu não queria ver. Mas, de súbito, ao primeiro sinal do apartamento vazio... ela surge. Eu me transformo num pervertido, porque ela insinua a si mesma, no corpo de uma adolescente, as nuances sensuais de uma mulher.

Ela cavalga um travesseiro - ou seria a própria cama como um todo masculino? - enquanto eu observo, atônito pela primeira vez. Meses se passaram e contemplo o gesto de surpresa, novamente. Deve ser a camisola da mãe que ela veste, pois é maior que suas medidas.

De rosa, ela acaricia sua rosa secretamente onde se apóia... o travesseiro é mesmo um todo masculino e recebe o úmido rubor de sua rosa, esfrega, finge que toca, sem as mãos... aquece, entumesce - bem rosadinha, que me faz imaginar a mulher que ali já quer nascer.

Mostra. Mostra pra mim, menininha...

Portais

Em todas as manhãs
o mesmo sol
joga pela terra as chaves
dos pórticos da mente.

Que seus fúlgidos raios
para sempre rasguem
o firmamento,
como na boa aurora após o vendaval.

Iluminem, ao mesmo tempo,
os recantos da alma
para que guardemos as chaves
do futuro.

domingo, 17 de agosto de 2008

Esconde



Esconde. Esconde de mim, menininha...
esconde bem debaixo da tua calcinha
- de tecido perfumada, em estrelas coloridas -
teu desejo aprisionado e fantasias reprimidas.

Esconde, esconde pra mim, minha linda,
toda essa hipocrisia que colocam na berlinda;
mas o prêmio é só teu, nem eu posso te dar
o prazer que, entre suas pernas, sozinha vais achar.

Hoje és mulher, ontem foste debutante -
vês como a doce infância passa num instante?
Agora, teu mundo é em direção ao outro,
teu futuro companheiro, a tocar-lhe o íntimo tesouro.

Mas antes disso, vais ter de descobrir,
tudo o que te faz doer e o que teu corpo quer pedir;
toque, cheire e prove sem medo o aljôfar da vida
para que assim, no momento a dois, saibas ser conduzida.

E ainda antes na tua solidão, livre da sociedade
é que vais saciar tua curiosa vontade:
inocentes e nervosas, tuas mãos no úmido vale
para que, contemplativo, de gemidos teu corpo fale.


Num carro, perto da faculdade

O que diabos ela estava fazendo ali?
Sentada comigo, no carro, mal conversando como velhos amigos. Eram próximas as salas da faculdade e o bar, mas estávamos ali: sentados, lado a lado dentro do carro, sem música ligada em bom volume, sem assuntos pendentes.

Só ali. Como velhos amigos. E eu dizia Tenho que ir, ao que ela não respondia de nenhuma maneira; só ali ficava, com vontade de sorrir, mas numa tristeza estranha como a de um mau dia que não passou.
O que eu vou pensar?, eu pensava... e o único questionamento que seus olhos me faziam era Quem é você? - ela me conhecia, de longe... Mas não eu a ela.

Num momento, porém, esboçou um sorriso e não quis a porta abrir.

Por quê diabos sonhei com ela?

sábado, 16 de agosto de 2008

Ferramentas de (des)uso

As armas que estão dentro de mim
são para rabiscar o lento giro do mundo.
Minhas mãos são o lápis
e meu horizonte, o próprio estojo
de onde saco a vontade de pintar.

Quero cantar o mundo multicromático
das flores, dos métodos e anseios de ontem
e que se unem no desperdício de hoje:
como escrever com tantas idéias sem fluxo?

A fome que empurra é compelida pela mente que impõe
que se deve:

Parir, compor, organizar e classificar

Submeter à crítica, reescrever,

padrão, estética,

movimento, conclusão,

inten(s)ção,
informação,
viagem, lúdico suspiro...

Sistêmica
escala
formato
projeto...

Sorte mesmo tinham os trovadores!

domingo, 10 de agosto de 2008

Cerejas

E te amei porque não convivemos.
E nesta ausência, me sustento.

Pois a saudade é o conservante 
do mais-que-perfeito.