Era uma quarta feira de um dia cinza, com chuva tímida e intermitente.
Pois foi quando, novamente, em suas poucas recentes investidas ao mundo exterior, ele se sentiu anulado de qualquer traço de personalidade própria.
Como poderia ele, que sempre tratou todos tão bem, que sempre foi simpático, educado, questionador, paciente, poderia se sentir tão só, tão invisível?
Se se faz um contrato consigo mesmo, de ser "o melhor possível", como é possível renová-lo?
Seria tal contrato realmente necessário?
Porque ele ouviu naquela música algo como: "Though I cannot change the world we're living in, I can always change myself" - e essa foi só mais uma das muitas canções que o perseguem, que o condenam, mas que legitimam e permeiam sua vida.
Ele é guiado por boas canções. Quer compor, quer falar as pessoas através das suas próprias.
Mas ele também quer mudar. Pois, como naquela mesma canção que há dias o persegue, ele não pode mudar o mundo, mas pode mudar a si mesmo.
Já é final da tarde desta quarta-feira de cinzas - assim é possível chamar - e ele sente necessidades. Necessidades de ser visto, de seu telefone tocar, de algo ou alguém para tirar-lhe do sedentarismo que o ocupa quando não está somente trabalhando. Seus olhos estão caindo, sua juventude mantém-se no espírito, na vontade de vencer, sobrepujando todo tipo de mal humor externo ou condições que o estressem.
Ele quer correr. Ele quer voar e gritar, e cantar, e tocar.
Mas como poderia ele ser visto, se não se deixa o ser?
Ele quer sair da burocraria microfísica que o atormenta os dias, as noites, os beijos, as faltas de gente, de dinheiro, de tudo.
Ele quer gritar, e explode por dentro - não sabendo dizer se de raiva ou de amor.
Mas ele somente grita. Somente. E em silêncio.
Para voltar a sentir o sol lhe queimar a pele
e devolver a textura pulsante dos dias quentes.
Isto é vida querendo viver.
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